sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Na Crista da Onda - Capítulo 8

Eles pararam. Tinha quase a certeza que estavam a falar de mim, pois as suas vozes morreram assim que entrei na cozinha iluminada pelo sol da manhã. Podia ver a costa de Newport Beach através das janelas.
- Que se passa? - Perguntei-lhes.
Os meus pais entre-olharam-se mutuamente com cumplicidade. Algo não estava certo. O meu pai lançou um olhar suplicante de aviso à minha mãe. Ela agitou os seus cabelos castanhos compridos, que lhe cobriram a cara e o ombro. Avançou, determinada e rapidamente para a porta das traseiras, saindo para o pequeno jardim luxuriante que se encontrava logo a seguir à porta de vidro. Eu percebi o que se passava quando o meu pai me olhou com uma expressão culpada.
- Oh não! Tu contaste-lhe?! - Interroguei, surpreendido e revoltado.
- Esperavas que não o fizesse? - Replicou, ainda mais surpreendido que eu.
- Não, mas esperava que me deixasses que eu o fizesse, ou que eu estivesse presente quando o fizesses! - Exclamei.
Ele ficou desarmado.
- Ela perguntou... - começou.
- E tu dizias para ela falar comigo! - Disse eu, friamente.
- Vais-me julgar por ser sincero com a minha mulher? - Desafiou.
- Não, mas vou julgar-te por teres posto o teu filho numa situação destas! - Afirmei, voltando para a sala.
A minha mãe era mais conservadora que o meu pai. Eles eram de ambientes diferentes. A minha mãe sofreu uma educação austera por parte dos meus avós, no seio de uma família rica. O meu pai, por outro lado, era um surfista, filho de pais pobres, que haviam falecido pouco após o seu nascimento e tinha ficado a cuidado de um casal amigo dos meus avós paternos. eles sempre lhe ensinaram a valorizar o amor, qualquer que fosse a forma como esse sentimento era expresso. A minha mãe, por outro lado, teve dificuldades em convencer os meus avós de que o meu pai era um bom partido, apesar das poucas posses. ter um filho homossexual não devia ajudá-la muito a manter uma imagem "limpa" aos olhos dos meus avós. Avós esses com quem eu nunca me dera muito bem.
Enquanto pensava, sentei-me no sofá, cruzando as pernas. O meu pai apoiou os braços nas costas do sofá, sentando-se de joelhos por trás de mim e colocando a cabeça sobre as mãos.
- Desculpa, filho... Eu não fazia a ideia que ela era assim tão...
- Homofóbica? - Arrisquei, grunhindo.
- Mm... posto nesses termos parece algo mau... - comentou.
- Talvez porque a homofobia é má? - Perguntei retoricamente.
- Pois... Mas ela não sabe como há-de reagir... - Defendeu-a ele.
Olhei para ele. A sua cara de arrependimento metia mais dó que um cachorro a ganir amuadamente e mexia mais comigo do que os olhos grandes e brilhantes do Gato das Botas do Shreck. Nunca conseguia ficar chateado com o meu pai mais de dez minutos quando ele fazia aquela expressão.
- Achas que devo falar com ela? - Interroguei.
- Talvez seja melhor esperares mais um pouco, para ela interiorizar...
- Ok, então vou ter com o Dante.
O meu pai revirou os olhos, fazendo um sorriso torto que o deixava com uma cara de parvo.
- Credo, para que foi essa cara? - Exclamei.
- Diz-me tu. É a cara com que ficas quando falas no Dante, por isso é que soube que gostavas dele... - Atirou, voltando para a cozinha.
Corri para a porta de entrada e dirigi-me a casa de Dante. O meu pai deixara-o à porta de casa na noite anterior, por isso já sabia onde ele morava.
Assim que lá cheguei, vi um rapaz que eu nunca vira antes na minha vida. Os seus cabelos ruivos agitaram-se com leve brisa que soprava, vinda do mar-alto. Os seus olhos azuis perscrutaram-me, curiosos. Sorriu energicamente, caminhando para mim. Eu fiquei desarmado e atrapalhado com a sua atitude.
- Hey, tudo bem? - Cumprimentou-me.
O seu sotaque. Reconheci-o. Era o mesmo sotaque ligeiramente francês que Dante possuía. E o seu tom de pele clara era idêntico ao do meu namorado. Calculei que fosse Canadiano.
- Olá... - Hesitei.
- mm... pensei que os Californianos fossem mais hospitaleiros... - comentou, um pouco desapontado.
- Oh, e somos, desculpa, eu sou o Kyle Fisher. - Apresentei-me, estendendo-lhe a mão.
- O meu nome é Jack Pine. - Respondeu.
- Vens do Canadá? - Interroguei.
- Sim, como sabias? - perguntou.
- Conheço gente que é de lá. De Montreal.
- Eu também sou de Montreal! - exclamou, surpreendido e animado. - E essa pessoa que conheces que vem de Montreal, mora aqui?
- Sim...
- É o Dante? - continuou.
- É... - respondi hesitante.
- Ah, ainda bem... eu queria voltar a vê-lo. Desde que ele se mudou para aqui que nunca mais me voltou a falar...
- Vocês eram próximos? - disse eu, curioso.
- Bastante... Mais do que algumas pessoas achariam apropriado...
- Eram mais do que amigos?
- Pode-se dizer que sim...
Olhámos para a porta da casa quando ouvimos alguém sair. Dante estacou quando se apercebeu que nós ali estávamos. Os seus olhos saltaram para Jack, surpreendidos, olharam para mim, também surpresos, e voltou a olhar para ambos, desta vez, aterrorizado. Algo não estava bem. Eu sentia que algo estava errado. Muito errado.

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