Eu não costumo beber, mas dadas as circunstâncias, não sei que mais fazer. Peço mais uma rodada e olho em volta. Ele foi o primeiro que me chamou a atenção. Estava a olhar directamente para mim, com os seus olhos verdes.
- Dia difícil? – Pergunta, dando um golo no seu whisky.
- Sim… Mas nada que não se arranje. – Respondo.
- Mmm… Isso é o que costumam dizer… Até começarem a beber. – Replica.
- Vejo que também estás ocupado com o álcool. – Defendo.
- Não, apenas estou a beber um copo antes de ir para casa. – Argumenta.
- Sozinho? – Interrogo.
- Depende.
- De quê?
- Se levo ou não companhia. – Diz, convidativamente, pousando uma nota de cinco no balcão e levantando-se.
Ele dirige-se para a porta. O meu cérebro trabalha a cem à hora. Nunca tinha feito aquilo. Ir para casa com um estranho. Claramente ele fizera um convite. E claramente estava interessado em mim. Mas isso não faria de mim um estereótipo que eu abomino? Não é o meu dia, mas não estou assim tão desesperado. Ele desaparece no escuro da noite. Provavelmente nunca voltarei a ver aqueles olhos verdes. Os olhos dele ficaram-me na memória. E o seu sotaque… O seu francês é fluente, mas percebia-se que não era um falante nativo por causa da velocidade com que fala. Os franceses falam muito depressa, o que torna um bocado difícil de os estrangeiros acompanharem o ritmo.
Passo uma semana desde que o meu pai me pôs na rua. Estou a olhar em volta, para o meu novo apartamento. É do tamanho do meu quarto na Grande Maison. Não… É metade do tamanho do meu quarto da Grande Maison. Mas é uma casa. Precária, mas é uma casa. E é minha, por isso, ninguém ma pode tirar. Não tem uma vista fantástica, mas não posso ser demasiado selectivo. Fecho a porta e tranco-a. É um bairro duvidoso. Olho para o corredor. Estou prestes a dirigir-me para as escadas quando oiço uma voz familiar.
- Afinal sempre trouxe companhia para casa… - Comenta o homem do bar da outra noite.
- Oh… Moras aqui?
- Não, vim só ver como estava a minha casa. – Responde, sarcasticamente.
- Sentido de humor… Gosto disso… Sou o Richard. Ric para os amigos.
- Sou o Miguel. Miguel para os amigos. – Replica.
- Ah, então és estrangeiro, como eu pensei. – Comento.
- Sim. Português.
- Oh, o país do vinho do Porto. – Digo, sorrindo.
Pareço uma criança que acabou de acertar numa pergunta feita pela professora. Mas acho q ele fica surpreendido, porque me sorri. Ele segue o seu caminho e eu ainda fico ali durante um pouco, a divagar.
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